sábado, 5 de janeiro de 2013

cortar papéis
por sua textura e estampa
e deles extrair cartões e cartas
pode equivaler a molhar plantas e crianças
e se desviar por um instante num traço de luz
que atravessa planta água criança.

sábado, 15 de dezembro de 2012

























sendo uma espécie do cerrado
carecia fixar no olho um ipê de saudade
para deixar crescer no tempo
sua altivez amarela


terça-feira, 13 de novembro de 2012

deslizo pelos pequenos espaços que guardam um pouco de silêncio

em uma fresta que se prolonga entre os tacos no chão

ou no oco de um miúdo fruto seco

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Acontece
tantíssimas vezes
quando aperto meus seios
que,
na redondeza de suas encostas
erguem-se nos caminhos lá contidos
um desejo novo
que não se dissolve
e que a gente chama de ter um filho




Retire o passado e o futuro da seta do tempo. Segure os dois com a ponta dos dedos. Com lâmina afiada trace um segmento de reta na fina trama do presente e enfie passado e futuro presente adentro. Deixe que cada um cresça ao infinito decompondo o presente nos dois sentidos ao mesmo tempo.

terça-feira, 26 de junho de 2012



, há um verde ganhando aspecto lá onde pensei que estivesse o eu
um esqueleto de folha seca com o vento alcança o voo
aguardo nas fronteiras da linguagem a gestação de uma palavra
que tenha a natureza de um verbo à galope
e que se efetue no silêncio entre um e outro encontro do casco contra o chão,


segunda-feira, 21 de maio de 2012


...e os bichos pequenos iam se acalmando na medida em que lia Blanchot.






Princípio-ar





O tempo é capaz de um truque mais estranho. Certo incidente insignificante, que ocorreu em dado momento, outrora, esquecido, e não apenas esquecido, despercebido, eis que o curso do tempo o traz de volta, e não como uma lembrança, mas como um fato real¹!, que acontece de novo, num novo momento do tempo. Assim o passo que tropeça nas pedras mal niveladas do pátio dos Guermantes é de repente - nada é mais súbito - o mesmo passo, não "um duplo, um eco de uma sensação passada ... mas essa própria sensação". Incidente ínfimo, perturbador, que rasga a trama do tempo e por esse rasgão nos introduz em outro mundo: fora do tempo, diz Proust com precipitação. Sim, afirme ele, o tempo esta abolido, já que, numa captura real, fugidia mas irrefutável, agarro o instante de Veneza e o Instante de Guermantes, não um passado e um presente, mas uma mesma presença que faz coincidir, numa simultaneidade sensível, momentos incompatíveis, separados por  todo o curso da duração. Eis portanto o tempo apagado pelo próprio tempo; eis a morte, essa morte que é obra do tempo, suspensa, neutralizada tomada vã e inofensiva. Que instante! Um momento "liberto da ordem do tempo", e que recria em mim "um homem liberto da ordem do tempo".
 Mas logo, por uma contradição que ele mal percebe, de tão necessária e fecunda, Proust diz, quase por descuido, que esse minuto fora do tempo lhe permitiu "obter, isolar, imobilizar da duração de um raio - o que ela nunca apreende: um pouco de tempo em estado puro". Porque essa inversão? Por que aquilo que esta fora do tempo põe a seu dispor o tempo puro? É que, por essa simultaneidade que fez juntarem-se realmente o passo de Veneza e o passo de Guermantes, o então do passado e o aqui do presente, como dois agoras levados a se sobrepor, pela conjunção desses dois presentes que abolem o tempo, Proust teve também a experiência incomparável, única, da estase do tempo. Viver a abolição do tempo, viver esse movimento, rápido como um "raio", pelo qual dois instantes, infimamente separados, vêm (pouco a pouco, embora imediatamente) ao encontro um do outro, unido-se como duas presenças que, pela metamorfose do desejo, se identificassem, é percorre toda a realidade do tempo e, percorrendo-a, experimentar o tempo como espaço e lugar vazio, isto é livre dos acontecimentos que geralmente o preenchem. Tempo puro, sem acontecimentos, vacância móvel, distância agitada, espaço interior em devir onde as estases do tempo se dispõem numa simultaneidade fascinante, o que é tudo isso, afinal? É o próprio tempo da narrativa, o tempo que não esta fora do tempo, mas que se experimenta como um exterior, sob a forma de um espaço, esse espaço imaginário onde a arte encontra e dispõe seus recursos.
1. Trata-se, naturalmente, para Proust e na linguagem de Proust , de um fato psicológico, de uma sensação, como ele diz.

terça-feira, 19 de abril de 2011